O ESTADO DE EXCEÇÃO COMO PRÁTICA NECROPOLÍTICA:
Narrativas dos atores sociais no documentário Hiato, de Vladimir Seixas
Narrativas; documentário; necropolítica; estado de exceção; memória.
Esta pesquisa tem como objeto o documentário Hiato (2008), de Vladimir Seixas, que retrata a ocupação do shopping Rio Sul, no Rio de Janeiro, em 2000, por manifestantes majoritariamente negros e moradores de favelas. Partimos da compreensão de que o documentário, conforme propõe Rezende (2013), opera com traços do real, mas não se limita a ele: sua linguagem é atravessada por escolhas estéticas, políticas e narrativas que constituem uma interpretação do mundo. O objetivo geral é identificar, nas narrativas das personagens, evidências do estado de exceção como ferramenta necropolítica (Agamben, 2004), que sustenta os regimes de exclusão operantes sobre os corpos periféricos que protestam em Hiato. Em outras palavras, trata-se de pensar a periferia como o campo onde o dispositivo político da exceção se manifesta como necropoder (Mbembe, 2016). Os relatos evidenciam a negação de direitos fundamentais, como a liberdade de ir e vir e o acesso pleno aos espaços da cidade. Por que ir ao shopping é permitido para uns e negado a outros? A partir dessa provocação, discutimos o conceito de documentário dentro do regime representativo das artes, entendendo-o como imagem-documento (Comolli, 2008). O ato político representado em Hiato revela os jogos de força e as disputas simbólicas que atravessam o espaço urbano. Os testemunhos dos manifestantes, confrontados com os conceitos de necropolítica e estado de exceção, evidenciam o comum partilhado nas margens como elemento estruturante da narrativa do oprimido. Nesse sentido, o documentário configura-se também como suporte de uma memória fragmentada e exposta, que se inscreve como símbolo de resistência. Sua contranarrativa apresenta-se como espelho de um mal-estar coletivo, desvelando as contradições de uma sociedade marcada por profundas desigualdades.