Características clínicas e desfechos da covid-19 em pessoas vivendo com HIV

COVID-19. HIV. Unidade de Terapia Intensiva. Ventilação Mecânica. Mortalidade.

Introdução: A pandemia da covid-19 trouxe grandes desafios para as pessoas que vivem com o vírus da imunodeficiência humana (PVHIV). Evidências demonstram associação entre infecção pelo HIV e complicações clínicas na covid-19, porém os resultados sobre gravidade e mortalidade permanecem inconsistentes. Além disso, faltam estudos que investiguem a influência da infecção pelo HIV nos desfechos da covid-19 na América Latina, em diferentes ondas da pandemia. Objetivo: Avaliar características clínicas e desfechos de pacientes

coinfectados pelo HIV e SARS-CoV-2 e comparar esses desfechos com uma amostra pareada sem infecção pelo HIV, em dois anos consecutivos. Métodos: Trata-se de um estudo proveniente de duas grandes coortes brasileiras que compreendem um total de 41 hospitais, incluindo pacientes com diagnóstico confirmado de covid-19 nos anos de 2020 e 2021. A coleta de dados foi realizada por revisão de prontuários para obtenção das variáveis de interesse. Os desfechos primários foram admissão em unidade de terapia intensiva (UTI), ventilação mecânica invasiva e óbito. Pacientes com covid-19 e infecção pelo HIV foram pareados com os controles usando escore e propensão (até 4:1), por idade, sexo, número de comorbidades e hospital de origem. Os grupos foram comparados por meio do Teste Qui-Quadrado ou Teste Exato de Fisher para variáveis categóricas e Teste de Wilcoxon para variáveis contínuas. Os resultados foram considerados estatisticamente significativos ao nível

de significância de p<0,05. Resultados: Entre os 17.101 pacientes com covid-19 hospitalizados durante o período do estudo, foram identificadas 130 PVHIV (86 em 2020 e 44 em 2021). A idade mediana nos períodos de 2020 e 2021 foi de 54 e 53 anos, respectivamente, sem diferenças significativas entre casos e controles. Ambos os grupos apresentaram frequência semelhante de comorbidades nos dois períodos do estudo, exceto por

menor frequência de obesidade (5,8% vs 16,8%; p = 0,016) e por maior frequência de doença pulmonar obstrutiva crônica (9,3% vs 3,8%; p = 0,049) e câncer (15,1% vs 7,1%; p = 0,032) entre as PVHIV, em 2020. Os sintomas de COVID-19 mais frequentes entre os grupos foram dispneia (2020: 60,5% vs 67,0%; p= 0,314 / 2021: 68,2% vs 69,7%; p = 0,989) e febre (2020:58,1% vs 61,1%; p= 0,710 / 2021: 45,5% vs 43,4%; p= 0,942). Em relação às informações específicas relacionadas à infecção pelo HIV, todas as PVHIV com dados disponíveis estavam em terapia antirretroviral (2020 e 2021: 100,0%) e a maioria tinha cargas virais suprimidas (2020: 78,1% e 2021: 71,4%). Em 2020, apenas 54,7% das PVHIV com dados disponíveis tinham contagens de linfócitos T CD4+ acima de 500 células/μL, entretanto, 70,0% tinham contagens acima de 500 células/μL em 2021. PVHIV e seus controles apresentaram prevalências semelhantes de internação em UTI e necessidade de ventilação mecânica invasiva nos dois períodos, sem diferenças significativas. Em 2020, a mortalidade hospitalar foi maior no grupo HIV comparado aos controles (27,9% vs. 17,7%; p = 0,049), porém esse achado foi muito semelhante entre ambos os grupos em 2021 (25,0% vs. 25,1%; p> 0,999). Conclusão: Os resultados reiteram que as PVHIV apresentaram maior mortalidade por covid-19 nos estágios iniciais da pandemia. No entanto, esse achado não se sustentou em 2021, quando a mortalidade entre as PVHIV mostrou-se semelhante ao grupo controle.